Receita Federal do Brasil considera indedutível da base de cálculo do IRPJ e CSLL o valor estornado de crédito de ICMS na aquisição de insumos para fins de obtenção do crédito presumido/outorgado

O ICMS está sujeito ao regime da não-cumulatividade, previsto no art. 155, §2°, inciso I da Constituição Federal de 1988, mediante compensação do valor devido em cada operação de circulação de mercadoria ou prestação de serviço (débito) com o montante pago em etapas anteriores (crédito).
Para fazer jus a determinados incentivos fiscais de ICMS, como por exemplo os créditos presumidos e/ou outorgados, por vezes os contribuintes são compelidos a realizar o estorno proporcional dos créditos do imposto destacado nos documentos fiscais de aquisição dos insumos (recolhidos em etapas anteriores).
Como este crédito de ICMS deixa de ser recuperável na escrita fiscal (não é compensado com débitos do imposto), os contribuintes tendem a registrá-lo como custo de aquisição de estoque no Ativo Circulante, nos moldes do Item 11 do Pronunciamento Técnico CPC 16. No momento da venda dos estoques, estes valores são alocados no resultado como custo da mercadoria vendida, o qual reduz o lucro tributável pelo IRPJ e pela CSLL, o que está correto.
Ato contínuo, o valor integral do incentivo fiscal de ICMS é contabilizado diretamente no resultado como receita ou como redutora da despesa de ICMS sobre vendas.
Entretanto, a Receita Federal do Brasil entende que os valores dos créditos de ICMS estornados, para fins de obtenção de incentivos fiscais, não são dedutíveis da base de cálculo do IRPJ e CSLL, conforme se verifica nos trechos extraídos da Solução de Consulta Cosit n° 15, de 18/03/2020:
(…)
23.1 Para que um imposto possa ser considerado como não recuperável e integrar o custo do produto produzido, a pessoa jurídica não deve possuir formas de recuperar o valor por meio de créditos. Verifica-se que, no caso em análise, o crédito de ICMS obtido em decorrência da compra de insumos era, a princípio, um imposto recuperável, deixando de o ser em virtude das regras previstas na legislação que rege a concessão da benesse fiscal pelo Estado de São Paulo. Dessa forma, a recuperação desse tributo não será feita por liberalidade da consulente que, visando à obtenção do crédito outorgado, estornará os créditos tomados na entrada dos insumos utilizados na produção das mercadorias abrangidas pelo incentivo, não se constituindo, assim, nos termos da legislação do IRPJ e da CSLL, como custo do produto produzido.
(…)
23.4. Em consequência do exposto, o valor do crédito da ICMS tomado na entrada no insumo e estornado para obtenção da benesse fiscal, R$1.000.000,00 no exemplo hipotético, não pode ser considerado como custo ou despesa para fins de apuração das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL. Assim, se este valor for deduzido na apuração do lucro líquido, deverá ser adicionado na determinação do lucro real e do resultado ajustado do período correspondente. (grifou-se)
Na visão do Fisco, os créditos de ICMS escriturados nas aquisições de insumos e posteriormente estornados para fazer jus ao crédito outorgado não podem acarretar a redução da base de cálculo do IRPJ e CSLL, pois decorrem de mera liberalidade dos contribuintes. E que caso os valores estornados sejam contabilizados como custo ou despesa, deverão ser objeto de adição no LALUR e LACS.
Entretanto, em soluções de consultas pretéritas, o Fisco posicionou-se pela consideração do valor do ICMS não recuperável como custo das mercadorias vendidas (Solução de Consulta COSIT n. 208, de 05/08/2015). Nesta mesma linha encontram-se precedentes do CARF (Acórdão 1202-000.944, publicado em 18/03/2013 e Acórdão 1802-001.678, publicado em 23/09/2013).
Além disso, o §3° do art. 301 do Regulamento de Imposto de Renda, aprovado pelo Decreto n° 9.580 de 22/11/2018, reforça o entendimento de que os impostos não recuperáveis integram o custo.
Outro aspecto importante a ser observado, é que o posicionamento da RFB impacta diretamente na forma como os contribuintes vêm apurando o valor dos incentivos fiscais de ICMS passível de dedução da base de cálculo do IRPJ e CSLL.
Conforme abordado pela Tróia em 18/05/2020 (Clique aqui para ler), diante da publicação da Lei Complementar n° 160/2017, que alterou o art. 30 da Lei n° 12.973/2014, e do precedente da 1ª Seção do STJ (EREsp n° 1.517.492 – 08/11/2017), alguns contribuintes, beneficiados por incentivos fiscais que resultam na redução ou anulação da carga tributária do ICMS, passaram a os excluir do lucro tributável pelo IRPJ e pela CSLL.
Levando-se em consideração o exemplo acima, alguns contribuintes procedem com a exclusão no LALUR/LACS do valor integral dos créditos outorgados/presumidos, sem considerar, contudo, que parte destes valores já reduziu a base de cálculo do IRPJ e CSLL na forma de custo da mercadoria vendida, decorrente do estorno dos créditos na entrada de insumos.
Na prática, o entendimento fiscal está amparado na premissa de que o montante a ser excluído do lucro tributável pelo IRPJ e CSLL é o efetivo proveito econômico decorrente do incentivo fiscal, qual seja, o montante da efetiva renúncia de receitas do Estado, que seria representado pelo valor bruto da desoneração tributária descontado dos estornos de créditos normais dela decorrentes (eis que estes últimos já reduzem o lucro na forma de custo).
Diante destas considerações, a Receita Federal do Brasil, ciente da operação de estorno de créditos de ICMS na entrada para fins de obtenção de incentivos fiscais, poderá notificar os contribuintes que excluírem da base de cálculo do IRPJ e CSLL valores superiores ao efetivo proveito econômico.
A Tróia encontra-se à disposição para esclarecimentos adicionais.
Afonso Baldissera
Setor de Tributos Sobre a Renda