Contribuintes devem estar atentos ao cumprimento dos requisitos legais para deixar de tributar pelo IRPJ e CSLL o valor dos incentivos fiscais do ICMS auferidos

A Lei Complementar nº 160/2017, editada para traçar as regras visando pôr fim à Guerra Fiscal entre os Estados, também alterou a legislação do IRPJ para dizer que a Receita Federal (RFB) não pode exigir outros requisitos além daqueles previstos em Lei para qualificar um incentivo fiscal de ICMS como subvenção para investimento, sobre a qual não incidem IRPJ e CSLL. Veja o que diz o texto legal (Lei nº 12.973/2014):
Art. 30 (….)
4º Os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao imposto previsto no inciso II do caput do art. 155 da Constituição Federal, concedidos pelos Estados e pelo Distrito Federal, são considerados subvenções para investimento, vedada a exigência de outros requisitos ou condições não previstos neste artigo. (Incluído pela Lei Complementar nº 160, de 2017)
5º O disposto no § 4º deste artigo aplica-se inclusive aos processos administrativos e judiciais ainda não definitivamente julgados. (Incluído pela Lei Complementar nº 160, de 2017) (grifou-se)
Isso foi necessário porque a RFB insistia em limitar a aplicação da regra isentiva, exigindo requisitos não previstos em lei. Exigia, por exemplo, que houvesse a concomitância entre o investimento e o recebimento da isenção.
Além disso, também em 2017, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), órgão julgador que dá a palavra final sobre a interpretação da legislação federal, decidiu que o IRPJ e a CSLL não incidem sobre o crédito presumido de ICMS, em resumo, porque um incentivo estatal não pode ser considerado renda (EREsp n° 1.517.492).
A edição da Lei Complementar n° 160, de 07/08/2017, assim como o julgamento do EREsp n° 1.517.492, em 08/11/2017, trouxeram à tona discussões no âmbito administrativo e judicial relacionadas à possibilidade de exclusão dos incentivos fiscais de ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL (Tema abordado pela Tróia em: https://troiaconsultoria.com.br/ir-csll-sobre-os-beneficios-fiscais/).
Depois disso, muito se noticiou que todos os incentivos fiscais de ICMS poderiam ser excluídos da base de cálculo do IRPJ e da CSLL independentemente do cumprimento de quaisquer requisitos.
Alguns contribuintes, beneficiados por incentivos fiscais que resultam na redução ou anulação da carga tributária do ICMS, passaram a os excluir do lucro tributável pelo IRPJ e pela CSLL. Entendem que este procedimento está alinhado com as Soluções de Consulta da Coordenação-Geral de Tributação (COSIT).
Entretanto, a situação não é tão simples como parece. A questão exige uma análise mais detalhada para certificação de que os requisitos legais estão sendo cumpridos e que a tributação pelo IRPJ e CSLL possa ser afastada, sem riscos de autuações fiscais pela RFB.
Para melhor ilustrar esta situação, veja-se a ementa e a conclusão da Solução de Consulta n° 11 – COSIT, uma das mais recentes e que foi publicada em 09/03/2020:
EMENTA
Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica – IRPJ LUCRO REAL. SUBVENÇÃO PARA INVESTIMENTO. BENEFÍCIOS VINCULADOS AO ICMS.
As subvenções para investimento podem, observadas as condições impostas por lei, deixar de ser computadas na determinação do lucro real. A partir do advento da Lei Complementar nº 160, de 2017, consideram-se como subvenções para investimento os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao ICMS concedidos por estados e Distrito Federal.
Dispositivos Legais: Lei nº 12.973, de 2014, art. 30; Lei Complementar nº 160, de 2017, arts. 9º e 10; Parecer Normativo Cosit nº 112, de 1978; IN RFB nº 1.700, de 2017, art. 198, § 7º.
Assunto: Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL LUCRO REAL. SUBVENÇÃO PARA INVESTIMENTO. BENEFÍCIOS VINCULADOS AO ICMS.
As subvenções para investimento podem, observadas as condições impostas por lei, deixar de ser computadas na determinação da base de cálculo da CSLL. A partir do advento da Lei Complementar nº 160, de 2017, consideram-se como subvenções para investimento os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao ICMS concedidos por estados e Distrito Federal.
Dispositivos Legais: Lei nº 12.973, de 2014, arts. 30 e 50; Lei Complementar nº 160, de 2017, arts. 9º e 10; Parecer Normativo Cosit nº 112, de 1978; IN RFB nº 1.700, de 2017, art. 198, § 7º.
ASSUNTO: PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL
É ineficaz a consulta, não produzindo efeitos, quando não versar sobre a interpretação de dispositivos da legislação tributária. Dispositivos Legais: Decreto nº 70.235, de 1972, art. 52, I, c/c art. 46. (grifou-se)
(…)
CONCLUSÃO
30 À vista do exposto, responde-se a consulente que:
31 As subvenções para investimento podem, observadas as condições impostas por lei, deixar de ser computadas na determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL. A partir do advento da Lei Complementar nº 160, de 2017, consideram-se como subvenções para investimento os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao ICMS concedidos por estados e Distrito Federal. (grifou-se)
A íntegra desta solução de consulta pode ser acessada aqui: http://sijut2.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?visao=anotado&idAto=107511
Os incentivos fiscais de ICMS são classificados como subvenções para investimento, nos termos do § 4° do art. 30 da Lei n° 12.973/2014 (inserido pela LC 160/2017), porém a sua exclusão do lucro real dependerá do cumprimento dos demais requisitos elencados no mencionado artigo. Veja-se a transcrição:
Seção XI
Subvenções Para Investimento
Art. 30. As subvenções para investimento, inclusive mediante isenção ou redução de impostos, concedidas como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos e as doações feitas pelo poder público não serão computadas na determinação do lucro real, desde que seja registrada em reserva de lucros a que se refere o art. 195-A da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, que somente poderá ser utilizada para: (Vigência)
I – absorção de prejuízos, desde que anteriormente já tenham sido totalmente absorvidas as demais Reservas de Lucros, com exceção da Reserva Legal; ou
II – aumento do capital social.
1º Na hipótese do inciso I do caput , a pessoa jurídica deverá recompor a reserva à medida que forem apurados lucros nos períodos subsequentes.
2º As doações e subvenções de que trata o caput serão tributadas caso não seja observado o disposto no § 1º ou seja dada destinação diversa da que está prevista no caput , inclusive nas hipóteses de:
I – capitalização do valor e posterior restituição de capital aos sócios ou ao titular, mediante redução do capital social, hipótese em que a base para a incidência será o valor restituído, limitado ao valor total das exclusões decorrentes de doações ou subvenções governamentais para investimentos;
II – restituição de capital aos sócios ou ao titular, mediante redução do capital social, nos 5 (cinco) anos anteriores à data da doação ou da subvenção, com posterior capitalização do valor da doação ou da subvenção, hipótese em que a base para a incidência será o valor restituído, limitada ao valor total das exclusões decorrentes de doações ou de subvenções governamentais para investimentos; ou
III – integração à base de cálculo dos dividendos obrigatórios.
3º Se, no período de apuração, a pessoa jurídica apurar prejuízo contábil ou lucro líquido contábil inferior à parcela decorrente de doações e de subvenções governamentais e, nesse caso, não puder ser constituída como parcela de lucros nos termos do caput , esta deverá ocorrer à medida que forem apurados lucros nos períodos subsequentes.
4º Os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao imposto previsto no inciso II do caput do art. 155 da Constituição Federal, concedidos pelos Estados e pelo Distrito Federal, são considerados subvenções para investimento, vedada a exigência de outros requisitos ou condições não previstos neste artigo. (Incluído pela Lei Complementar nº 160, de 2017)
5º O disposto no § 4º deste artigo aplica-se inclusive aos processos administrativos e judiciais ainda não definitivamente julgados. (Incluído pela Lei Complementar nº 160, de 2017) (grifou-se)
Depreende-se da transcrição acima que há uma série de requisitos e condições para que as subvenções para investimento, tais como os incentivos e benefícios fiscais do ICMS, não sejam computadas no lucro tributável, a exemplo do caput, que determina que o incentivo seja concedido “como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos” e, também, que os recursos da subvenção sejam registrados em reserva de lucros para absorção de prejuízos ou aumento do capital social.
Além disso, o § 2° estabelece que as doações e subvenções serão tributadas caso “seja dada destinação diversa da que está prevista no caput”. Ou seja, se as subvenções (leia-se incentivos/benefícios fiscais do ICMS) não forem concedidas como estímulo à implantação ou expansão de empreendimento econômico (conforme consta no caput), deverão ser tributadas normalmente pelo IRPJ e CSLL.
Com base neste raciocínio, estão sendo proferidos acórdãos pelo CARF amparados na análise da legislação estadual que concede incentivos fiscais de ICMS e na certificação de que havia, de fato, a intenção do legislador em fomentar investimentos. Exemplos: Acórdão nº 1402-004.539 – 1ª Seção de Julgamento / 4ª Câmara / 2ª Turma Ordinária (11/03/2020), Acórdão n° 1402-004.008 – 1ª Seção de Julgamento / 4ª Câmara / 2ª Turma Ordinária (13/08/2019) e Acórdão nº9101-004.336 – CSRF / 1ª Turma (07/08/2018).
Como dito anteriormente, a matéria é muito mais complexa que parece. Além dos pontos mencionados acima, há outros que, se não observados, implicarão exposição a riscos de vultosas autuações fiscais.
Portanto, os Contribuintes devem estar atentos à legislação que concede incentivos fiscais de ICMS, bem como aos termos e condições porventura firmados com o governo estadual, a fim de certificar que estão sendo cumpridos os requisitos do art. 30 da Lei n° 12.973/2014, para fins de afastamento da tributação pelo IRPJ e CSLL.
Afonso Baldissera
Setor de Tributos Sobre a Renda