Contribuintes devem estar atentos às controvérsias no âmbito da Transação Tributária

A transação tributária vem se consolidando como um dos instrumentos mais relevantes para empresas que buscam regularizar sua situação fiscal com condições diferenciadas. Além de trazer alternativas mais equilibradas de pagamento, contribui para reduzir a litigiosidade entre contribuintes e fisco.
Contudo, sua aplicação prática ainda gera embates relevantes no Judiciário. Decisões recentes demonstram como os tribunais têm se posicionado sobre pontos críticos, impactando diretamente na operacionalização do instituto:
1) Demora da Receita Federal do Brasil em inscrever débitos em dívida ativa da União (encaminhamento à PGFN):
Encerrado o contencioso administrativo perante a RFB/CARF, os créditos tributários não desconstituídos e não pagos devem ser encaminhados para inscrição em dívida ativa da União, possibilitando o início da cobrança via execução fiscal.
Ocorre que, em muitos casos, essa inscrição demora meses, ultrapassando inclusive o prazo de 90 dias previsto na Portaria MF 447/2018 e no art. 22 do Decreto-Lei 147/1967. Essa morosidade pode impedir o contribuinte de aderir tempestivamente aos editais de transação da PGFN.
Em março de 2025, foi publicada decisão liminar pela 3ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Maranhão, no sentido de que a demora no encaminhamento de débitos à dívida ativa não pode impedir a adesão ao programa de transação tributária, determinando que a RFB “proceda com a remessa imediata dos débitos tributários devidamente constituídos para a PGFN, que estejam vencidos há 90 dias, com a consequente inscrição na dívida ativa, a fim de possibilitar a realização de transação excepcional…” (Processo nº 1014519-76.2025.4.01.3700).
A decisão destacou que a inércia administrativa poderia acarretar a perda de prazo para adesão ao edital PGDAU nº 1/2025, vigente até maio de 2025, comprometendo o fluxo de caixa da empresa.
Neste mesmo sentido, decisão de 29/11/2023, da 14ª Vara Federal do Porto Alegre (5074829-49.2023.4.04.7100/RS).
Importa observar que também há previsão de transação para débitos ainda em discussão administrativa perante a RFB/CARF, conforme abordamos neste artigo: https://troiaconsultoria.com.br/novos-editais-de-transacao-no-ambito-da-receita-federal-do-brasil-aspectos-praticos/.
2) Honorários advocatícios de sucumbência por conta da desistência de discussões judiciais:
Para fins da transação tributária, o inciso IV do art. 3° da Lei n° 13988/2020 estabelece a obrigatoriedade de “desistir das impugnações ou dos recursos administrativos que tenham por objeto os créditos incluídos na transação e renunciar a quaisquer alegações de direito sobre as quais se fundem as referidas impugnações ou recursos”.
Por conta disso, instaurou-se a discussão entre contribuintes e União Federal sobre a obrigatoriedade de pagamento dos honorários de sucumbência nos processos em que houve a desistência, nos termos do art. 90 do CPC (Lei 13105/2015).
Em 06/2025, a Primeira Turma do STJ, no julgamento do Recurso Especial nº 2.032.814, por maioria de votos, afastou a cobrança dos referidos honorários de sucumbência na hipótese de desistência para fins da transação tributária.
A decisão cria um precedente importante, porém ainda é necessário aguardar pronunciamento no âmbito da Segunda Turma do STJ, bem como na evolução do julgamento do Tema 1317 de recurso repetitivo, que visa “Definir se, à luz do CPC, é cabível a condenação do contribuinte em honorários advocatícios sucumbenciais em embargos à execução fiscal extintos com fundamento na desistência ou na renúncia de direito manifestada para fins de adesão a programa de recuperação fiscal, em que já inserida a cobrança de verba honorária no âmbito administrativo”.
O resultado dessa discussão poderá impactar diretamente a atratividade da transação para créditos em litígio judicial, uma vez que os honorários podem neutralizar os benefícios financeiros obtidos com os descontos.
3) Suspensão (quarentena) de dois anos para nova transação:
O §4° do art. 4° da Lei 13.988/2020 estabelece que “Aos contribuintes com transação rescindida é vedada, pelo prazo de 2 (dois) anos, contado da data de rescisão, a formalização de nova transação, ainda que relativa a débitos distintos.”
A controvérsia reside no termo inicial desse prazo: se a partir do fato que ensejou a rescisão (ex.: atraso da 3ª parcela) ou apenas após a conclusão do processo administrativo de rescisão, que pode ocorrer muito tempo depois.
Há decisões divergentes sobre isso, como por exemplo:
- Favorável aos contribuintes: sentença de 05/2025 (processo 5012085-67.2025.4.03.6100): o ato de rescisão formal da transação – após regular exercício do contraditório no bojo de procedimento administrativo (art. 4, §1º, Lei nº 13.988/20) – possui natureza declaratória, e não constitutiva, já que não cria nova situação jurídica, e como tal, retroage seus efeitos à data de ocorrência da circunstância material impeditiva da manutenção do acordo de transação. Em sentido semelhante, o processo 5015778-93.2024.4.03.6100.
- Desfavorável aos contribuintes: o TRF3 entendeu que “o inadimplemento das parcelas é uma das causas que autoriza a rescisão da transação (art. 4º, caput, Lei 13.988/2020), não se confundido com a rescisão em si.” (processos nº 5004354-84.2025.4.03.0000 e nº 5003016-75.2025.4.03.0000).
Em 02/2025, um precedente considerado inédito, proferido pelo Desembargador Francisco Alves dos Santos Junior, no âmbito do TRF da 5ª Região, derrubou completamente a exigência da quarentena, ao fundamento de que “Esse tipo de prazo não pode ser delegado a uma Autoridade de terceiro escalão, porque restritivo de direitos e só quem pode restringir direitos num regime democrático é o Legislador, por Lei. E no campo tributário essa Lei tem que ser Lei Complementar(art. 146,III, b), porque se trata de obrigação tributária”. Apesar disso, tal decisão foi reformada em 07/2025 (processo 0801350-37.2025.4.05.0000).
A transação tributária é, sem dúvida, um instrumento poderoso para a regularização fiscal e a otimização da saúde financeira das empresas. Porém, como demonstrado, sua utilização envolve nuances jurídicas e desafios interpretativos que demandam análise técnica aprofundada e acompanhamento próximo da jurisprudência.
Se deseja saber mais sobre o assunto, visite:
https://troiaconsultoria.com.br/transacao-conforme-a-capacidade-de-pagamento-edital-pgdau-11-2025/
A Tróia Consultoria encontra-se à disposição para dirimir eventuais dúvidas.
Afonso Baldissera
Setor de Tributos Sobre a Remuneração e Tributos Diversos